quarta-feira, abril 14, 2021

Pizza fria

 



PIZZA FRIA

Quase meia noite, ela ouve um barulho da cozinha. Olhou da porta do seu quarto e viu que era sua mãe. Era 31 de dezembro, mas a doença da mãe impediu comemorações. E somando as restrições devidas à pandemia, nem tinham clima para isso. 

O pai estava dormindo. Sono pesado, de quem já viveu e trabalhou muito nos quase 84 anos de vida e luta.

Foi para a cozinha e resolveram dividir as três fatias de pizza que tinham sobrado do lanche feito mais cedo. E comeram assim mesmo, frias, acompanhadas pelo suco de uva, já que a mãe não gostava e nem podia tomar bebidas alcoólicas. 

Passaram a meia noite ali mesmo. E sozinhas na cozinha viveram muito provavelmente o último réveillon que dividiriam. O sentimento era de paz. 

Na mesa, pizza fria e suco de uva, o pão e o vinho da sua última ceia.

 


Marcia Carvalho

Teresópolis, 04 de abril de 2021

(Escrevi este texto enquanto minha mãe estava na última das muitas internações hospitalares que teve desde  março de 2020. Este relato não é ficção.)

quinta-feira, dezembro 31, 2020

Esperançar

 


"É preciso ter esperança. Mas tem que ser esperança do verbo esperançar. Porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. Esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperança é a capacidade de olhar e reagir àquilo que prece não ter saída. Por isso, é muito diferente de esperar; temos mesmo é de esperançar."

Sempre que passamos por uma dia marcante, como aniversário ou a noite de passagem de ano, mesmo sem querer temos a tendência de achar que no dia seguinte tudo vai ser diferente. E na imensa maioria das vezes, não é. Mudar de ano não significa que tudo vai estar novo no dia seguinte. Mas devolve as nossas esperanças de dias melhores. 

2020 foi um ano muito diferente de todos os outros anos para nós. Pareceu que estávamos num daqueles filmes pós apocalípiticos, tentando sobreviver. Um ser tão pequeno que nem consegue ser visto em um microscópio comum virou o mundo de cabeça para baixo: o Sars-Cov-2, um vírus, chegou e nos tirou até o direito de abraçar aqueles que amamos mas que não moram conosco. 

Tivemos que suportar a saudade dos amigos, enfrentar o medo quando saíamos na rua, nos vimos no meio de máscaras e álcool em gel, tentando nos proteger e proteger os nossos amados. Perdemos tanta gente querida para esse vírus. Talvez tenha sido um dos anos mais tristes que vivemos.

Por outro lado, coisas boas também aconteceram. Reconhecemos que precisamos dos nossos amigos e inventamos novos jeitos de estar juntos sem estar perto. Redescobrimos como a Arte é importante na nossa vida: ouvimos mais músicas e vimos mais filmes, já que não nos restaram muitas opções de lazer. Percebemos mais do que nunca como os profissionais de saúde e da educação são fundamentais na nossa vida.

Muita gente usou esse tempo para aprender algo novo. Muita gente não conseguiu, e não tem problema algum nisso: estamos no meio de uma pandemia, não de um retiro espiritual. 

Amanhã, quando 2021 começar, acho que todos gostaríamos que acordássemos com céu azul, brisa no rosto e o fim desse pesadelo. Mas não vai ser assim. O céu azul e a brisa talvez apareçam. Mas o pesadelo vai continuar.

Só que assim como o mocinho daqueles filmes que falei lá em cima, apesar do cansaço e das dores, estaremos ainda buscando o sonho, porque sem esperança a gente não vive.

Que todos nós tenhamos um 2021 cheio de esperança e de realizações!


Marcia Carvalho,

                                                                           Teresópolis, 31 dez 2020


P.S.: o texto que começa esta reflexão é do livro Pedagogia da Esperança, de Paulo Freire


Nós também estamos no IG: www.instagram.com/eu.pensandocomigomesma


terça-feira, dezembro 29, 2020

O lago


 Lago das Fadas, Floresta da Tijuca, RJ, 2008
foto: arquivo pessoal


Quando conseguiu avistar o lago entre as árvores e os arbustos, não tinha muita certeza de como chegara até ali.

No momento que inspirou mais fundo, sentiu a umidade enchendo o seu peito. E junto com ela, um arrepio percorreu o seu corpo.

Lembrou-se do arrepio que sentiu anos atrás, quando viu o mesmo lago pela primeira vez e tocou sua água fria. Tinha sido apenas um toque rápido: a água fria encostou em seus pés e, num susto, se retraiu.

A emoção daquele arrepio permaneceu em uma das suas gavetas de lembranças, aquela que não era muito mexida, porque era repleta de impossibilidades.

Mas a umidade do lago abriu a gaveta: continuava cheia de cheiros, sensações, lembranças... E de impossibilidades: umas antigas, outras nem tanto. Algumas, tais como pequenas mariposas, voaram gaveta afora e se esvaneceram no ar, deixando um quase invisível rastro de poeira naquele minúsculo raio de sol que entrou por uma fresta da janela mal fechada.

E olhando o lago, sentou-se na sua margem, abraçou as pernas e ficou observando as libélulas que davam seus pequenos mergulhos na água, desejando, por um instante ter a mesma coragem.

 

Marcia Carvalho,  

Teresópolis, dezembro 2020 

 


segunda-feira, dezembro 28, 2020

5 anos depois, tô aqui de volta...




Este ano, 2020, está sendo um ano super turbulento para o mundo todo. Quem diria que além de todos os problemas políticos que nosso país enfrenta, uma pandemia tomou o mundo todo e o colocou em suspenso... Parece que estou vivendo em um filme distópico e ruim...

E eu comecei a sentir uma grande angústia, uma vontade de voltar a escrever, mais para organizar meus pensamentos do que para qualquer outra coisa.

Então, voltei!

Exatos 5 anos e 3 meses depois do meu último post, estou de volta! Não vou estabelecer frequência de postagem; vou escrever sempre que conseguir, sempre que achar necessário, mas sem me prender a prazos.

Em breve, tô pensando em fazer algumas "reformas": um novo layout, novas cores... mas por enquanto vou deixar assim mesmo. Me perdoem a preguiça...

Vocês são todos bem vindos aqui! A casa é nossa!

segunda-feira, setembro 28, 2015

SEGURA A ONDA, DORIAN GRAY




Hoje é meu aniversário: 46 anos!
E é assim que eu me sinto: cada vez mais bela, cada vez mais velha, cada vez mais linda.

Mas não da mesma forma que encarava esses conceitos quando tinha 20 ou 30 anos.
Desde que fiz 40 anos, encaro a vida com mais leveza, sem cobranças desnecessárias aos outros e, principalmente, a mim mesma.

Se antes "dava um boi pra não entrar numa briga e uma boiada pra não sair dela", hoje dou o boi e a boiada para evitar conflitos desnecessários. Com isso, guardo energia para batalhar pelo que realmente importa.

Não perco mais o meu tempo fazendo mais do que posso para tentar agradar aos outros: aprendi a respeitar os meus limites, sem me sentir culpada por isso.

Continuo tentando fazer da simplicidade o meu modo de vida. Cansei de coisas complicadas, cansei de quem complica as coisas. E mais ainda: cansei de eu mesma complicar o que pode ser simples.

Sigo em frente, tentando demonstrar meus pensamentos e meu modo de ver a vida com sinceridade, mas sem perder a doçura. Porém, continuo humana: de vez em quando baixa um azedume, do qual me esforço para me livrar, e nem sempre consigo.

Hoje é dia de celebrar!
E de agradecer ao Eterno por sua intensa generosidade comigo, principalmente nos últimos tempos.
Ainda tenho muito chão pela frente, muito a conquistar... Mas consigo olhar para trás e entender o caminho que me fez chegar até aqui. E olhar pra frente e ver que a estrada está apenas começando.

Então, vambora!


PS.: A frase da imagem que abre este texto é da música "Segura a onda, Dorian Gray", que pode ser ouvida aqui:






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