As redes sociais nos permitem entrar em contato e "conhecer" pessoas que, de outra forma, talvez nunca conhecêssemos.
O Tom Fernandes é uma dessas pessoas, followed no Twitter e amigo no Facebook. Hoje, no seu blog "pequenos dramas", li um de seus textos e resolvi publicá-lo aqui.
Boa leitura! E visitem o Tom, ele é crítico, divertido e acho que vocês vão gostar.
Tom Fernandes
O amor está em maus lençóis. A paixão se encontra banalizada, numa rima pobre com liquidação. Saudade é coisa que passa com prozac e uma webcam qualquer. Se a felicidade já é quase um direito fundamental do ser humano, já já garantido por constituição, logo logo teremos umas nova leva de manifestantes se mobilizando em alguma occupymyheart da vida. E, o pior, uma safra de poetas adocicados e felizes-sem-fim se reproduz por osmose.
As crianças do meu tempo falávamos de ninjas e policiais e todos tinham na ponta da língua as técnicas para prender bandidos e invocar a poderosa Genki Dama. As crianças de hoje falam de amor com a mesma propriedade e profundidade. Ângelo Gaiarsa sofreria derrame pleural de ver tantos especialistas absolutos no mais obtuso e pantanoso campo da experiência humana.
O que mais me espanta nestes novos poetas da ágora virtual é a facilidade para falar de amor, alegria, gozo, prazer, satisfação. Não que não nos apaixonássemos no colégio e na faculdade, mas sabíamos a dor daquilo, sabendo-o efêmero e temerário. E atravessava-se todo o colegial com a mesma paixão a consumir tempo, sono e inúmeras resmas de papel, por fim destinadas ao lixo.
Hoje tenho visto gente dizendo “eu te amo mais que tudo” com lágrimas nos olhos para três ou mais em menos de um ano! E não que a pessoa seja falsa, leviana ou vulgar, ela apenas acha que toda sensação diferente de fome, sono e cansaço seja amar. E amar dessa maneira não encontra limites, nem fronteiras, virou até mote de empresa de celular (lógico que a rima não podia faltar).
E o amor passado? Não valeu, óbvio, porque a atual juventude amante aprendeu que o amor é uma sensação anfetaminizada e seus poetas estão sempre em busca da próxima dose, do próximo pico. Não cultivam mais carinho pela namoradinha do pré, não olham mais de rabo de olho ao passar pela rua da menina do vôlei. Hoje o amor vive-se em ondas, total wireless, sem cabo, conexão alguma (nem com a realidade).
Hoje não se respeita o vaticínio de Drummond sobre ser poeta e a difícil arte de escrever sobre o amor. Talvez venha daí essa profusão de duplas sertanejas universitárias e autores e perfis adocicados nas redes sociais. Desculpe-me, mas não suporto ler mais nada de Caio Fernando Abreu. O que ele escrevia sobre amor é uma afronta a Chico, Caetano, Vinícius e Tom. As canções da Paula Toller têm mais alma, experiência e peso que esse falecido (sim, Caio morreu há mais de cinco anos) ícone da poetosfera.
Antes que você me chame de ranzinza, mal amado ou frio (a quem quero enganar, você já está pensando tudo isso de mim) quero dizer umas últimas palavras. Você está apaixonado e quer viver este amor como se fosse o último? Vá lá, mergulhe e seja feliz durante o tempo em que conseguir prender a respiração. Mas não se esqueça de ser ridículo, de sofrer também da angústia de ter de voltar à tona e respirar. Como disse Cartola, o profeta do amor partido alto: Vai chorar, vai sofrer, isso acontece!
Termino deixando claro que amo os amantes, vibro e torço pelos amigos que amam. Mas amar não os torna poetas e especialistas no amor, assim como respirar não nos torna especialistas em pneumotórax e andar não nos dá gabarito pra prescrever como alcançar os altos cumes do Himalaia. Já disse Zeca Baleiro: As canções de amor se parecem porque não existe outro amor!