sábado, dezembro 17, 2011

A VIDA É TÃO RARA!

Eu sempre gostei de circo. Quando criança, em Teresópolis, sempre que tinha circo eu e meus irmãos íamos ver  "o maior espetáculo da terra", o que, na minha concepção criança, não era exagero algum. Meu primeiro circo foi o Garcia, depois o Vostok... Lembro de fazer coro com as crianças: "Hoje tem marmelada? Tem sim, senhor! Hoje tem goiabada? Tem sim, senhor! E o palhaço, o que é? Ladrão de mulher!" Outros circos vieram, mas só me lembro do último que assisti lá, o do Marcos Frota. Cresci, mudei, e fui em outros circos... a última vez, há uns dois ou três anos, aqui na Praça XI, no Rio, um circo do qual esqueci o nome, mas que tinha um balé das águas... 


Mas, por que toda essa conversa de circo?






Em 1989 me mudei para Niterói. Conversando com algumas pessoas, soube que lá nunca tinha circo, pois a cidade tinha ficado traumatizada por uma tragédia ocorrida muitos anos antes, num circo que se apresentava lá. Ouvi alguns relatos curtos, que falavam do grande incêndio, do desespero da população, dos milhares de voluntários que se uniram para levar gelo e água aos hospitais onde os feridos estavam. Também soube que foi aí o surgimento do Profeta Gentileza, figura mítica aqui do Rio, que deixou sua marca pintada em painéis nos pilares dos viadutos próximos à Rodoviária Novo Rio: "Gentileza gera Gentileza.


Essa semana, zapeando a TV, descobri que o incêndio no Gran Circus Norte Americano em Niterói, a maior tragédia num circo no Brasil, completa 50 anos hoje, 17 de dezembro de 2011.


Em 50 minutos, quase 400 pessoas foram mortas no local, além de mais de 100 outras vítimas nos hospitais, entre queimados e pisoteados. O Estádio Caio Martins virou uma fábrica de caixões. Durante dias, pessoas doavam sangue, água, medicamentos, lençóis e gelo. Muitos corpos nunca foram reconhecidos e até hoje pessoas tentam saber notícia dos seus desaparecidos.


Por volta do ano 2000, eu estava morando mais uma vez em Niterói. E depois de tanto tempo, era a primeira vez que um circo estava lá. Muitos dos moradores mais antigos não quiseram ir, pois o trauma vivido ainda doía. Mas eu fui. E foi a primeira vez que a minha filha, com seus 4 anos, ia em um circo. Foi muito lindo ver os seus olhinhos brilhando com o que ela via, a carinha de susto e apreensão com os malabaristas e trapezistas, o riso solto com os palhaços.


As tragédias acontecem e com uma frequência muito maior do que podemos digerir, isso é fato. E se tem uma coisa que devamos aprender com elas é que devemos valorizar a vida, que, no seu sentido pleno, se torna cada vez mais rara. Afinal, o espetáculo não pode parar...


Desde o dia 15 já sabia que iria escrever algo hoje, no dia do "aniversário" do incêndio no circo. Mas nem de longe poderia imaginar que escreveria logo após receber a notícia do suicídio de um amigo.  


É, a vida é tão rara!




Nos links a seguir, história e depoimentos sobre o incêndio no circo e algumas fotos da tragédia em Niterói e matéria do JB de hoje, 17/12/2011, sobre o assunto.


Para quem quiser saber mais, o jornalista Mauro Ventura lançou recentemente o livro "O espetáculo mais triste da história", em que narra a tragédia do Gran Circus.


.

5 comentários:

Marcos Vichi disse...

Lindo texto!

Eu nunca fui muito fã de circo. Me lembro que eu fui uma vez, quando criança depois, nunca mais.

Meus sentimentos pela perda de seu amigo.

Bjs,

Marcos Vichi

Marcia Carvalho disse...

Muito obrigada, Marquinho!

José Junior disse...

Circos sempre farão parte de nossa vida... principalmente nós, do "interior", onde o circo sempre trazia alegria e emoção...

Mais emoção ainda senti ao ler teu texto, Marcita... ainda mais com tanta dor, mesmo em meio às alegrias da vida...

O espetáculo TEM QUE continuar... a vida é tão rara, tão rara... e todo dia haverá de ter marmelada e goiabada, sim... para que nossa alegria nunca tenha fim.

Continue escrevendo... não pare, tá?

Bjs do Zé!

Marcia Carvalho disse...

Que bom que você gostou, Zé!

A triste coincidência do dia e do fogo vão ficar marcadas, mas não podemos apagar as luzes do picadeiro... Oo espetáculo da vida continua, e mesmo com as dores, ela é bonita, é bonita e é bonita!

Bjs!

Marcos Vichi disse...

Aqui está uma referência ao livro sobre o incêndio do circo, que u li na coluna da Cora Rónai, no O Globo):

(...) Tenho que ir embora, ainda preciso escrever a coluna dessa quinta-feira.

– Sobre o que vai ser?

– Ainda não tenho certeza, mas talvez seja sobre um grupo de amigos que se encontra num almoço de fim de ano… E tenho que arranjar um espacinho para recomendar aos leitores o livro do Mauro Ventura, “O espetáculo mais triste da terra”, que li em três dias de tão bom que é.

– É sobre o circo que pegou fogo em Niterói?

– Isso mesmo. O Mauro conseguiu fazer uma reportagem sensacional, que se lê de um fôlego só. É um livro imperdível, muito bem pesquisado e escrito.

– Já está anotado.

– Então é isso. Vou indo. Feliz Natal para vocês!

– Feliz Natal!

(Cora Rónai - O Globo, Segundo Caderno, 22.12.2011 - http://is.gd/FCZVRj)

Related Posts with Thumbnails