quinta-feira, outubro 26, 2006

ASSOMBRO



ASSOMBRO


Estou lendo “O Evangelho Maltrapilho”, de Brennan Manning. Ainda não terminei, mas estou saboreando cada página, tão cheia do evangelho da graça!

Tudo o que eu li até agora me faz pensar, refletir... me desperta sentimentos, sensações... Estou me deliciando!

Um dos trechos que me chamou atenção foi o início do capítulo cinco “Biguás e Gaivotas”, onde é contada a história de um rabino, Abraham Joshua Heschel, que no seu leito de morte confessa a um amigo que o que ele tinha pedido a Deus, tinha recebido. Ele pediu assombro, e Deus concedeu.

E começa-se a descrever sobre coisas do cotidiano que hoje não nos causam mais assombro. Perdemos o senso do assombro!

“Já não perdemos o fôlego diante de um arco-íris ou do perfume de uma rosa (...). Ficamos maiores e todo o resto ficou menor, menos impressionante. Tornamo-nos apáticos, sofisticados e cheios de sabedoria do mundo. Não deslizamos mais os dedos sobre a água, não gritamos mais para as estrelas nem fazemos caretas para a lua. Água é H2O, as estrelas foram classificadas e a lua não é feita de queijo. (...)
Ficamos tão preocupados conosco (...) que nos tornamos imunes à glória da criação. Mal notamos a nuvem que passa sobre a lua ou as gotas de orvalho nas folhas da roseira. (...) Evitamos o frio e o calor. Refrigeramos a nós mesmos no verão e sepultamo-nos debaixo de plástico no inverno. Rastelamos cada folha assim que cai (...) nunca paramos pra pensar sobre a liberalidade da criação de Deus. (...) Perdemos a experiência do assombro, da reverência e da maravilha!”

Há quanto tempo eu não parava pra pensar nisso tudo? Logo eu, criada aos pés do Dedo de Deus, o conjunto de montanhas mais incrível – e assombroso - que já vi. Tá na foto aí em cima: uma gigantesca mão apontando para o céu, para cima, para o alto, para o Altíssimo!

Anteontem resolvi passear na Floresta da Tijuca. Beber a água adocicada da fonte. Ver a cachoeira e sentir o spray da água. Ouvir o silêncio da floresta. Borboletas e libélulas. Os raios de sol através das folhas. O tamanduá-mirim. O cheiro do verde. A gruta e mais uma cascata. Outro tamanduá. O açude da solidão.

Ontem eu fui caminhar na pista de cooper da Praia Vermelha, na Urca. Que lugar maravilhoso, bem no encontro do mar com as montanhas! As ondas batendo nas pedras. O barulho gostoso da água. O cheiro bom do mar. A cor da água, um verde-jade inesquecível. A linha do horizonte misturando céu e mar num azul indescritível.

Quanta coisa assombrosa!

Como disse Davi, no salmo que hoje chamamos de 19, “Os céus declaram a glória de Deus; o firmamento proclama a obra de suas mãos. Um dia fala a outro dia, uma noite fala a outra noite. Sem discurso nem palavras, não se ouve a sua voz. Mas a sua voz ressoa por toda a terra, e as suas palavras até os confins do mundo.” (nvi)


Marcia Carvalho
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segunda-feira, outubro 23, 2006

CAIO E A AMARGURA

Recebi esse texto do Caio Fábio numa lista de discussão da qual participo. Gostei tanto que resolvi colocá-lo aqui. Quanta verdade junta!



Nada falsifica mais a realidade e a comunicação do que a amargura.

Quando ela se instala, pela via das machucaduras, das traições, das frustrações, das repetições desagradáveis, ou das muitas acusações recíprocas — nada mais continua a existir objetivamente na visão e na comunicação entre duas pessoas.

É assim até mesmo entre pessoas que se amam, mas que se feriram de alguma maneira.

Na maioria das vezes alguém feriu alguém, e o ferido se magoa profundamente — dependendo do fato, se magoa até a morte —; e se decide continuar a relação porque vê amor naquele que o magoou (embora lhe tenha sido infiel ou desleal, ou estranho), geralmente não consegue ir adiante sem expor sua dor; a qual, quase sempre, no início vem carregada de acusação, mesmo quando não acusa intencionalmente. Entretanto, como o objeto em questão, é o próprio ouvinte-arrependido, ele acaba por se sentir sempre acusado outra vez.

Com o passar do tempo, aquele que feriu a quem ama, também já está ferido e magoado de um outro modo. Ainda que ele (a) saiba que não tem direito de estar. Mas fica assim mesmo. No caso dele tudo começa com a tristeza imensa de ter magoado a quem ama. Depois, a pessoa começa a desejar se sentir diferente de "si mesma" no que tange ao "si mesmo" que provocou a mágoa no outro. Entretanto, como a dor do ofendido e magoado continua naturalmente presente; muitas vezes apesar de já haver perdão (a dor é outra coisa) —; com passar do tempo aquilo que aos ouvidos do ofensor era culpa, começa a soar como acusação sem fim, mesmo quando é apenas a confissão da tristeza pelo que aconteceu.

Nesse ponto o ofensor passar a se irritar e a acusar o outro de não parar de acusá-lo e de vê-lo de modo ruim... Então, instala-se no coração do ofensor uma predisposição a ouvir tudo com tom de acusação.

Ora, quando se chega a esse ponto da "viagem", o sentido de objetividade já entrou em estado de falência; e todos os poderes da subjetividade se tornam os senhores do olhar, do sentir; e, pior, do interpretar. Daqui para frente somente uma intervenção da Graça de Deus os ajudará a sair desse Labirinto de Dês-comunicação! Sim, uma intervenção que gere consciência nos implicados e também lhes revele a existência desse Monstro Invisível.

E mais: que lhes ilumine e revele que de fato tal "ente" que "penetrou" o processo mental e de comunicação deles, é inexistente; posto que somente "existe" como emoção machucada, a qual falsifica tudo; fazendo com que carinhos sejam sentidos como ofensa; fazendo com que tentativas de comunicar, se tornem discussões inexplicáveis; e também fazendo com que toda expressão que não seja clara e objetivamente comunicada como boa, seja sentida pelo outro como uma incógnita ruim; sempre ruim; e sempre contra aquele que ouve e interpreta — ainda que de fato o outro não tenha intentado nada de mal contra aquele que assim ouviu e sentiu.

É aqui que duas pessoas que se amam e não mais conseguem se entender, perguntam-se: o que está acontecendo com a gente? Na realidade, nada está acontecendo, embora tudo pareça acontecer! Afinal, objetivamente, o que tinha de acontecer, já aconteceu. E, supostamente, já está resolvido. Porém, o processo de retro-alimentação relacional (em razão das dores e das machucaduras da alma do ofendido, e em razão da culpa e da vergonha do ofensor), torna-se cada vez mais destrutivo para as emoções dos implicados; e, consequentemente, passa a ser o produtor de boicote na comunicação. O que fazer?

A primeira coisa é entender o processo, conforme simplificadamente exposto acima.

A segunda é colocá-lo em seu lugar: na memória doída, mas que não tem que existir como acusação nem na boca de quem sente a dor, e nem nos ouvidos de quem a provocou.

A terceira é voltarem a crer um no outro, sem interpretações e sem analises.

A quarta é darem objetividade e clareza a cada palavra ou declaração, não somente em relação um ao outro, mas também em relação a tudo; até que a objetividade volte a prevalecer sobre a subjetividade das interpretações adoecidas pela mágoa.

A quinta é não conversar num mundo paralelo, jamais; mesmo que seja em quase silencio ou em silencio; pois para o outro isso pode significar outra coisa; qualquer coisa.

A sexta é coragem de olhar nos olhos do outro, todos os dias, e relembrá-lo de quem ambos são um para o outro. Sim, afirmarem-se mutuamente como pessoas que se amam, apesar de machucadas.

A sétima é não deixar nada aberto, sem definição. Ou seja: não deixar o sol se por sobre nenhuma ira ou mágoa não falada. Mas isto apenas no caso de coisas que não possam ser resolvidas sem uma "conferência" entre ambos.

A oitava é crer que quem se ama, pode se machucar, mas que o amor tem que ser maior que qualquer dor, quando dois decidiram continuar juntos.

A nona é saber que a tendência de um processo desse tipo, é fabricar algo que não é nada, mas que se faz cheio de tudo o que não existe ou não lhe pertence; e, que, portanto, pode se munir de tudo contra ambos; ou um contra o outro. Aqui o diabo e o inferno são os limites; posto que agora, em tal caso, reina a acusação.

A décima é se perdoarem todos os dias; e também perdoarem-se por qualquer que seja a recaída no processo de retro-alimentação da amargura, e que tenha voltado a crescer em razão das "interpretações" que se tornam falsas realidades; mas que têm o poder de matar o que é real e verdadeiro. Por isto, não se pode deixar isto crescer jamais.

O escritor de Hebreus disse que uma raiz de amargura, entrando em alguém, pode contaminar a muitos, a todo um grupo.Ora, se a amargura tem esse poder em relação a uma "congregação", quão maior não é o seu poder de contaminação entre duas pessoas? Ou entre um casal? Ou nas entranhas de uma família?

Assim, eu oro:
Senhor! Dá-nos Tua luz, para que nela sempre vejamos o que é real, sendo assim salvos das miragens do Engano e do Enganador!
Senhor! Ajuda-nos a viver o que é real! Senhor! Que o amor sempre vença todas as falsificações!

Nele, que é a Verdade,
Caio

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sábado, outubro 14, 2006

CARTA DE MIM PRA MIM MESMO

Mais uma do Roberto... ele publicou no blog dele no dia do meu aniversário...
Pode não ter tido a intenção, mas foi um presentão pra mim!
http://www.smalltalk.com.br/blogs/poesia

Carta de mim pra mim mesmo
28 de Setembro de 2006

Olá, não me conheces.
Mas sabes quem fui, o que pensei,
E quando eu ri, quando chorei,
Conheces minha vida e minha história.
Tua memória é minha
Teu futuro, meu passado
Teu anseio, meu cansaço
Do que seria e não fui
Do que serás, pra mim e pra ti.

Se aceitares o conselho
De um velho, todavia,
Eis aqui o que te digo,
O que tu mesmo te dirias:

Vive a vida, é teu presente.
Que futuro e passado não importam;
Só importa o que tu és,
Pois nada mais trago comigo;
O que sou, o que não és,
É também o que me faz ser teu amigo.
Que somos um,
Um só, e o mesmo
E ainda, mesmo assim,
Não me conheces.

Ainda é tempo; e que o tempo,
Esse velho companheiro,
Seja tão só teu amigo,
E não senhor;
Nem do que foi ou que virá,
Nem mesmo do que entre nós persiste;
Nem do tempo que há entre mim e ti,
Nem mesmo do que agora não existe;

Que sejas tal como eu sou
E eu seja tal como tu és
Que venhas a me conhecer
Como eu também conheço a ti.

Até mais ver.

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